Pesquisa


Projetos Mais Acessados

  1. Comunicação e cultura na Johannes Keller Schule em São Caetano do Sul
  2. A Segunda Guerra Mundial no ABC e a trajetória de seus combatentes
  3. Ativismo feminista e questão racial
  4. Comunicação, Identidade e Memória na Comunidade Germânica no ABC
  5. Culturas e linguagem: metáforas em identidades, ritos e cerimônias nas
  6. Associações alemãs em São Paulo
  7. Punks do ABC: bandas, gangues e idéias de um movimento cultural...1980
  8. Risos e lágrimas:o teatro amador em Santo André na década de 1960
  9. O Grupo Teatro da Cidade: experiência profissional nos palcos do ABC..
  10. A alma feminina nos palcos do ABC: o papel das atrizes (1965 a 1985)

Todos os Temas
Todos os Projetos

Silvio Augusto Minciotti

Silvio foi professor do IMES, onde criou o INPES, ligado, a revista IMES, o CEAPOG. Também foi diretor da instituição. Atualmente (2008) exerce a função de Reitor da USCS (IMES).

Foi presidente do IBGE e da FEPASA.

Imagem do Depoente
Nome:Silvio Augusto Minciotti
Nascimento:24/10/1947
Gênero:Masculino
Profissão:administrador
Nacionalidade:Brasil
Naturalidade:São Paulo (SP)

Transcrição do Depoimento de Silvio Augusto Minciotti em 07/07/2005
Depoimento de SÍLVIO AUGUSTO MINCIOTTI, 57 anos.

Universidade Municipal de São Caetano do Sul, 07 de julho de 2005.

Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC 

Entrevistadores: Elias Estevão Goulart, Priscila F. Perazzo e Danielle Barbosa.

Transcritores: Meyri Pincerato, Marisa Pincerato e Márcio Pincerato.

 

Pergunta: Por favor, comece falando a data e o local de seu nascimento e conte um pouco sobre a sua infância, sua família, sobre o que seus pais faziam.

 

Resposta:

Nasci em 24 de outubro de 1947. Fui criado na cidade, no centro da cidade de São Paulo praticamente. Meu pai tinha um comércio, era açougueiro, na Praça Marechal Deodoro, bem no centro de São Paulo. Eu me criei na cidade. Tive uma família de origem italiana, meu pai é italiano, minha mãe também tinha origem italiana e espanhola, mas acabou prevalecendo um pouco o lado italiano na estrutura e na cultura familiar. Era uma família muito comum dentro desse padrão. Uma família unida, com recursos escassos, mas com direcionamento voltado muito fortemente para a formação dos filhos, etc. E assim foi. Eu comecei a minha formação escolar num colégio de religiosas, que era perto de onde eu morava, o Externato Casa Pia São Vicente de Paula. Não sei se é um nome ou um currículo, é um nome bastante grande, mas que foi muito interessante. Depois eu fiz o ginásio no Colégio Maria José, também relativamente próximo da região. Aí acabei fazendo um curso técnico de química na Escola Técnica Mackenzie. Lá o conclui. Foi um período importante, porque foi naquele período da Revolução de 1964. Então, as coisas foram bastante intensas. Tinha aquela proximidade entre o Mackenzie e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e as diferentes exposições dentro da própria escola. Foi um período bem interessante do ponto de vista técnico, a formação técnica foi muito boa, a formação foi excelente, mas também foi importante porque tive a oportunidade de conviver com esse momento histórico na juventude, com todo o meu envolvimento pessoal. Foi muito rica essa fase. Depois, quando estava concluindo esse curso, que já foi escolhido por uma razão, eu queria ter a oportunidade de muito rapidamente poder exercer uma profissão, coisa que na época o científico e o clássico, que eram os cursos mais populares, não conferiam. Eu entendia que como um técnico poderia ter um emprego. A decisão não foi tão vocacionada. Ela foi muito mais pautada na busca de uma solução, porque eu precisava, eu sentia, embora muito jovem, que precisava encontrar um caminho que muito rapidamente pudesse ajudar de alguma maneira a me sustentar. Fiz o curso, gostei do curso, era um curso bom, mesmo sem essa vocação consegui até hoje ter uns fundamentos muito claros na minha mente. Aí eu tinha de escolher um curso superior. É muito provável que se eu tivesse seguido o meu pendor natural eu teria feito direito. Até hoje sou muito atraído pelas coisas do direito. Acho bonito o que acontece nessa área. A justiça e aqueles que fazem a justiça. Com todos os maus exemplos que a gente tem, com todas as circunstâncias que são usadas, ela não é acessível a todo mundo, é lenta, mas essas são outras questões. Mas eu precisava fazer um curso e eu não tinha ninguém, não tinha advogados na minha família. Se eu fizesse um curso de direito, eu ia ter muita dificuldade em começar uma carreira. Aí sim eu abri mão de uma certa vocação inicial e fui fazer o curso de administração.

 

Pergunta: Antes de chegar ao vestibular, o senhor pode contar um pouco sobre as suas brincadeiras de infância, sobre a família?

 

Resposta:

A coisa acontecia de uma forma muito bonita. Os almoços de domingo eram com muitos presentes, vinham os irmãos do meu pai, a família se reunia.

 

Pergunta: Você tem quantos irmãos?

 

Resposta:

Só o Fausto. Enfim, nós tínhamos a reunião da família todo domingo necessariamente. Tinha um outro tio, irmão do meu pai, meus dois tios, eram também açougueiros. Era muito cultuado esse momento e era uma época em que a televisão começava. Durante um longo tempo, eu vivi a minha infância sem ter televisão. Eu lembro que tinha um rádio que eu ouvia muito, desde os programas que a Jovem Pan, na época, que era uma emissora só de esportes, transmitia, desde pólo aquático até basquete. Era uma emissora de esportes, que não tinha grande audiência. Esse rádio, eu lembro que ele ficava em cima de uma geladeira. Naquela época a geladeira não era elétrica. Todo dia passava um caminhão na porta de casa e deixava um torrão de gelo e ele ia para dentro da geladeira. Então, esse rádio ficava em cima da geladeira e como eu era muito pequeno, eu encostava uma cadeira na geladeira e ficava ouvindo o rádio. Desde a Jovem Pan, passando pela PRK-30, que era um programa humorístico. E como minha mãe costurava para fora, ela tinha lá as atividades dela, meu pai tinha as atividades dele e assim a gente ia. Quando veio a TV eu passei ao padrão normal das famílias. Ela passa a ser um pouco o foco das atenções, todo mundo fica reunido em torno dela. Eu morava na Praça Marechal Deodoro e assim foi que a minha atividade nessa época, de jovem para adolescente, aconteceu.

 

Pergunta: Na década de 50, São Paulo era pequena. Era possível você brincar na rua, mesmo no centro de São Paulo?

 

Resposta:

Que coisa engraçada. A minha mãe e meu pai não deixavam eu brincar muito ali na praça. Eu tenho uma fotografia de quando eu tinha uns 3 anos de idade, onde eu estava segurando uma rosa no meio da Praça Marechal Deodoro, que tinha roseiras e elas davam rosas e as rosas ficavam nas roseiras. Era uma coisa muito bonita. Depois eu cresci e não deixavam eu ficar muito porque já tinha toda uma atividade. Eu morava numa casa na praça e a minha diversão era percorrer os telhados do quarteirão. Eu não podia ir para a rua, então eu tinha um pé de ameixa onde eu subia e percorria todos os telhados do quarteirão.

 

Pergunta: Nunca caiu?

 

Resposta:

Caí, quebrei o braço esquerdo. Mas na rua eu saía pouco. Tinha uma travessinha, quando eu tinha uns 12 anos, onde eu ia jogar bola, porque não tinha movimento, era uma rua sem saída. Era na mesma rua onde tinha uma família que tinha uma televisão. Então, eu ia aos domingos lá assistir aos jogos televisionados, enquanto não tinha televisão em casa. Era o televizinho. Não dá para dizer que eu tinha amigos no bairro. Não dava. A Praça Marechal Deodoro já era o centro da cidade e a única coisa que fazia era ir, de vez em quando, jogar um futebolzinho. Depois eu tive a oportunidade, meu pai se associou ao Palmeiras e eu fui jogar futebol lá. Sempre fui sãopaulino, desde aquela época, mas fui jogar futebol de salão na equipe do Palmeiras.

 

Pergunta: Onde era?

 

Resposta:

Na Rua Turiaçu. Eu pegava um ônibus. Naquela época tinha um ônibus chamado Penha-Lapa. Eu pegava esse ônibus e eu descia em frente ao Palmeiras e voltava. Como eu treinava na equipe, eu conseguia freqüentar um pouco o clube.

 

Pergunta: Lá por 1964 o senhor já estava com uns 17 anos, mais ou menos. Tem alguma lembrança de como foi a movimentação nessa época?

 

Resposta:

Houve tantas. Freqüentemente você tinha encontros, passeatas.

 

Pergunta: Naquele evento na Praça da República você estava?

 

Resposta:

Estava, mas naquele evento acabei chegando tarde e quando cheguei, a confusão já estava meio em ebulição. O que havia muito eram ações que picotavam aqui e ali e a gente tinha uma participação. Tinha toda aquela preocupação com sintonia, com segurança, não ser surpreendido. Na época eu era o presidente do Centro Técnico do Mackenzie, que era o núcleo, o órgão representativo dos alunos da escola técnica, que eram alunos de química, eletrônica e eletricidade. Na época eu estava engajado num processo de valorização do técnico. Já naquela época o técnico não era valorizado. A gente tinha o crivo do Conselho Regional de Engenharia e da Prefeitura, mas o técnico nem era figurante na sociedade. E a gente buscava essa autonomia, esse espaço para o técnico. Aí aconteceu a revolução e ficou uma coisa maluca, porque eu tinha o movimento que estava tocando junto com a Escola Técnica Getúlio Vargas, etc., tanto a de São Paulo como a do Rio, e já estavam em curso movimentos em âmbito nacional, buscando a consolidação do técnico, porque a gente percebia que isso se fazia necessário. Aí surgiu o negócio da revolução e eu tive problemas. Teve um momento em que fui preso, porque estava participando de uma reunião na Escola Técnica Getúlio Vargas, lá no Ipiranga e a segurança falhou e o pessoal chegou. Mas foi uma coisa rápida. Acho que não deu 48 horas.

 

Pergunta: Tinha aquela coisa de passar uma peneira pelo movimento, aquela preocupação?

 

Resposta:

Se eu disser que não tinha medo, estou mentindo. Eu tinha medo e vários tipos de medo. Eu tinha o meu medo pessoal físico, de alguma coisa me acontecer, tinha o medo das conseqüências, de algo que acontecesse a mim e pudesse acontecer também com a minha família. Eram momentos de tensão. Se você retirar a época da revolução, ser adolescente naquela época, naquele lugar em que eu morava, não era uma coisa muito simples. Tinha um filme que curiosamente retratava um pouco o que acontecia por ali, que era "West Side Story", só que a nossa vida não era musical. Hoje se chama de galera, mas você tinha as gangues que se encontravam. Lembro que pertencia a um grupo que nós usávamos uma jaqueta, dessas de marinheiro, e já naquela época tinha confrontos. Só que tinha uma diferença. Não morria ninguém, não tinha arma. Tinha muito soco, mas ninguém morria. Isso tudo era uma coisa que deixava, se você quisesse se enturmar de alguma forma, você tinha de se posicionar. Mesmo para quem, como eu, não tinha essa disposição de sair lutando, que não era para mim, não estou discutindo o meu temperamento, mas a necessidade de estar lutando ou conquistando espaço, não era exatamente por meio da força que eu buscava isso. Mas de alguma maneira você estava integrado. Ser adolescente naquela circunstância não era uma coisa simples. Só que isso virou nada diante do problema que surgiu quando veio a revolução.

 

Pergunta: Em 1964 já tinha essa consciência de que o negócio era complicado?

 

Resposta:

Tudo soava como uma coisa que rapidamente acabaria. Tudo era muito, era uma coisa natural o jovem fazer aquilo. O jovem não imaginava que pudesse ter uma conseqüência tão dramática como tantas ocorreram. Tantos jovens tiveram fins horríveis, sumiram. Tive amigos que nunca mais vi. Mas isso não era uma coisa que passava entre a gente. A gente achava que tudo aquilo era obrigação nossa fazer e seria tolerado sempre. Eram perspectivas que se confundiam um pouco. Aí começam a surgir sim notícias, mas isso já vem depois de 1968, onde está fulano, o que aconteceu, e aí a coisa começa a ficar mais evidente. Aquilo que se comentava um pouco aqui e ali, em 1966, já começa a ganhar corpo, e assim foi, até que decidi fazer a universidade. Aí eu me preparei. Eu escolhi administração de empresas e tinha um exame na Getúlio Vargas e havia 50 vagas e eu fui 52º e não consegui entrar na GV naquela época. E aí, premido pela necessidade de trabalhar, de tocar a minha vida, eu praticamente tinha desistido de estudar. Eu ia me empenhar na atividade porque precisava viver, tinha problemas na família, meu pai tinha morrido há pouco tempo e eu tinha tantas questões familiares para resolver. Não consegui entrar, paciência, porque tudo foi muito simultâneo. Eu terminei o curso de química e meu pai faleceu um pouco antes de eu terminar. Ele não viu o fim da história. Meu pai faleceu, em dois meses eu concluí o curso e já estava me preparando para a GV. Não consegui a GV, então chega, era o sinal que eu precisava para tocar a minha vida. Eu estava praticamente indo trabalhar como químico, chefiando turno de produção. Aí aqui em São Caetano surge uma escola de administração, com o convênio entre a Prefeitura e a ESAN de São Paulo. Este prédio nosso, o Campus 1, esse prédio inicial, seria o lugar onde se instalaria a Faculdade de Administração, que provisoriamente começou a funcionar na Rua Espírito Santo. O curioso foi o seguinte. Na época eu namorava minha mulher e ela, quando soube que ia ter o curso de administração, o que fez? Naquela época os namorados trocavam fotografias e ela pegou uma fotografia minha e fez a minha inscrição, sem que eu soubesse. E ela, muito novinha, tinha uns 17 anos, me entrega a inscrição. Eu falei que não queria mais fazer, mas ela achava que eu devia fazer. Certamente os pais dela devem ter sugerido alguma coisa. Eu vim, fiz o vestibular e entrei. Aqui na época se chamava ESAN, Escola Superior de Administração e Negócios.

 

Pergunta: Como veio a notícia de que a ESAN teria uma escola em São Caetano? Como repercutiu lá?

 

Resposta:

Na época a minha noiva morava em São Caetano.

 

Pergunta: A notícia não saiu em São Paulo?

 

Resposta:

Era uma notícia local, citada no jornal. E como a minha esposa, na época namorada ou noiva, morava aqui, ela ficou sabendo, veio e fez a inscrição. Eu fiz o vestibular e fui aprovado, porque eu tinha me preparado seis meses antes, então estava preparado. E a ESAN já tinha uma turma quando entrei.

 

Pergunta: Como era o custo da mensalidade?

 

Resposta:

A primeira turma, primeiro que a mensalidade era baixa, mas havia uma possibilidade de bolsa, até porque se imaginava que poderia haver um tipo de bolsa da Prefeitura, onde ela bancaria o estudo e, quando formado, o aluno pagaria à Prefeitura. Mas naquela época era tudo, o valor era muito pequeno. E nessa altura eu já estava trabalhando. Eu ia trabalhar por turno, como acabei de contar, já tinha até feito exame médico para começar na Fontoura. Mas uma outra empresa, a Oxigênio do Brasil, onde eu tinha feito um teste, liga para mim para me contratar, mas tinha de ser no mesmo dia. Eu fui trabalhar nessa empresa, como químico, mas na área de desenvolvimento de novas aplicações para gases industriais, laboratoriais e medicinais. Isso me colocou na área comercial e foi quando eu fiz a minha primeira aproximação, naquela época não se chamava de marketing, nem existia, mas foi quando eu me envolvi com a área comercial. Eu já estava trabalhando, meu salário era bom, o dobro do que ia ganhar como químico na outra empresa. Deu tudo certo. Eu já não tinha aquela vida franciscana. Voltando para a escola, a ESAN começou aqui, mas havia todo um conjunto de coisas que precisariam ocorrer. Quando a ESAN se instala, ela se instala com duas classes, alguns transferidos para o segundo ano e alguns no primeiro ano. Eu entrei no primeiro ano. Não aconteciam coisas, faltavam coisas que deviam estar previstas e não estavam, a evolução não vinha, os professores deixavam a desejar, tinha uma série de questões. Então, na época eu estava representando os alunos da escola e a gente veio até a Prefeitura dizer que a coisa estava complicada. Fomos até a ESAN em São Paulo. Antes disso houve uma ocupação da ESAN em São Paulo e a gente participou dessa ocupação. Conclusão, teve uma reunião do conselho da ESAN onde se discutiu o que iam fazer com São Caetano, porque aí o Prefeito de São Caetano tinha entendido, porque na época uma pessoa importante foi o professor Oscar Garbelotto, que era o diretor de educação e cultura, e ele soube entender que a perspectiva futura da ESAN em São Caetano não era, poderia dar problemas. Quando ele leva o assunto ao Prefeito, o Prefeito decide acabar com o convênio. Aí desmanchou o convênio, mas aconteceu uma coisa engraçada. Engraçada hoje porque deu certo. A ESAN, até para pressionar os alunos, falou que só ia aceitar transferências para a Unidade São Bernardo até o dia "x" e daí para frente não iam aceitar mais. Então, vocês fiquem nessa nova escola que vai nascer em São Caetano. Então cerca de uns 120, 130, de todos os alunos, alguns foram para São Bernardo, porque tinha uma unidade em São Bernardo e outros assinaram um protocolo dizendo que queriam seguir em São Caetano e eu fui o representante desse grupo junto à Prefeitura, para tentar conseguir a consolidação disso. O Marchetti também estava envolvido. Tinha uma condição imperiosa. Este prédio precisava ficar pronto, porque, se não, nós não íamos conseguir nos consolidar. Não ia dar para nos receber junto com a Faculdade de Economia, que teria um prédio para ela, que seria onde virou a Fundação das Artes depois. Num primeiro momento nós fomos para lá, porque fomos incorporados, mas essa incorporação se deu de uma forma muito interessante. O Prefeito da época acionou o Governador, que reuniu o Conselho Estadual de Educação no período de férias, para eles autorizarem a instalação do curso de administração. Isso é uma coisa que não é usual. Período de férias do Conselho é período de férias. Só que a reunião precisava acontecer, sob pena de não conseguir, em tempo hábil, criar espaço para que esses alunos pudessem ter oportunidade de estudar. Esse prédio, que era destinado a ESAN, tanto que tinha uma placa, ele acabou sendo o prédio da Faculdade Municipal de Ciências Econômicas, Políticas, Sociais e Administrativas, quando o curso de administração se incorporou à Faculdade de Economia. E assim a gente se engajou.

 

Pergunta: O senhor acompanhou a construção do prédio?

 

Resposta:

Diariamente.

 

Pergunta: Tem algumas histórias que o senhor já contou aqui. Como eram os professores da ESAN e os que vieram depois?

 

Resposta:

Na época nós apresentamos para a ESAN três nomes que gostaríamos que seguissem conosco. Perdão, não para a ESAN, mas para a Prefeitura de São Caetano, porque a Prefeitura de São Caetano nos consultou se tinha algum professor que seria de interesse trazer para a escola. Nós indicamos três nomes, o professor Fernando Conto, professor Werner Krause e o professor Mário, de sociologia, que era o representante da Fundação Padre Salgado Medeiros. Esses professores, que eram membros do corpo docente da ESAN seguiram conosco aqui e os outros foram sendo contratados e rapidamente se consolidou a escola e foram sendo contratados novos professores. Professores importantes como o professor Orestes e tantos outros que vieram integrar o corpo da escola. Daquele grupo da ESAN vieram três.

 

Pergunta: E a construção?

 

Resposta:

A construção passou a ser peça-chave na história. O prédio tinha de ficar pronto, porque se não ficasse pronto, essa era a condição que o Conselho Estadual tinha imposto. Ou tem o prédio ou não tem curso, porque não dava para colocar mais gente naquele prédio onde estava funcionando, onde hoje funciona a Fundação das Artes, e onde funcionaria a Faculdade de Economia, que era um curso com um número menor de alunos. Então, eu vinha diariamente acompanhar a obra. Um dia, eu acho que é essa situação, eu cheguei no momento em que havia uma discussão entre o arquiteto da obra e o engenheiro responsável. O arquiteto reclamava, muito fortemente, que o engenheiro tinha comprometido o projeto dele, porque afinal de contas tinha de ter respeitado e não respeitou. Ele se referia a umas vigas que tem no pátio central da escola. Essas grandes vigas deveriam ter uma superfície irregular. Aquele concreto deveria ter sido formado com tábuas de forma irregular, que desse uma certa condição de que quando ele iluminasse, porque ele ia iluminar paralelamente essa viga, deveria dar um efeito de luz e sombra, que estava na cabeça do arquiteto e o engenheiro não deu muita importância para isso e fez lá, fez a viga certinha, mas não fez irregular. O engenheiro falou que ia desmanchar tudo e fazer de novo, mas que isso ia atrasar a obra. Eu entrei na conversa, expliquei a história. E assim ficou. Eu informei à Prefeitura o que estava acontecendo e veio reforço falando que não iam mexer. Se vocês repararem, até hoje existem bicos de luz ao lado dessas vigas. Ali era previsto que se tivesse um pequeno holofote de cada lado para dar esse efeito. Isso foi uma passagem interessante e que talvez tenha justificado a vigília todo o tempo. No fim deu tudo certo.

 

Pergunta: A sua vigília, sua participação, não era uma coisa oficial? Era apenas de um estudante?

 

Resposta:

Aqueles 130 alunos colegas estavam dependendo disso. Eu tinha aquela responsabilidade porque o grupo tinha me delegado aquela responsabilidade, de acompanhar, negociar na Prefeitura e na ESAN.

 

Pergunta: Não tinha outras pessoas?

 

Resposta:

Tinha, mas a maioria tinha outras atividades. Eles trabalhavam nas empresas e eu fazia essa atividade fora e podia estar um pouco mais presente aqui.

 

Pergunta: E vocês mudaram para cá em 1968?

 

Resposta:

Imagino que tenha sido em 1969. Foi no final da década.

 

Pergunta: Você estava no primeiro ano?

 

Resposta:

Nessa altura já estava no segundo ano, porque essa confusão toda ocorreu durante o primeiro ano. No fim do primeiro para início do segundo. Era no início do ano letivo que precisava estar com tudo isso pronto.

 

Pergunta: E como era a característica do curso de administração e do perfil dos alunos?

 

Resposta:

Primeiro vou falar do perfil dos alunos. Eram muito mais velhos, a média de idade era alta. Todos tinham uma mesma preocupação em realmente fazer o curso bom. Era uma turma, diferentemente do que hoje a gente nota, naquela época havia projetos de vida, todo mundo tinha o seu projeto. Todo mundo tinha uma história, essas histórias eram muito conhecidas. A nossa escola nunca foi uma escola de um número grande de gente abastada. Eram todos, na sua maioria, empregados e buscando uma formação profissional que pudesse melhorar a sua carreira e condição. A média de idade era maior. Os professores tinham uma vivência muito grande, todos eles com formação boa, mas acima de tudo, com uma história de vida profissional muito grande. Isso era a tônica, uma marca da escola. Isso não quer dizer que todos os professores são fantásticos. Nenhuma escola tem 100% dos professores formidáveis, mas diria que era a maioria. Tinha um programa, o currículo do curso era bom, bastante diversificado e diria até adequado para o que se esperava para a formação.

 

Pergunta: (Inaudível)

 

Resposta:

Na época só existia o curso de administração de empresas. Depois começou a surgir possibilidade do curso de administração com várias modalidades, como comércio exterior, etc., tanto que depois acabou tendo a mudança, que hoje vigora, onde você tem um curso de administração. O profissional hoje não é mais administrador de empresas, mas um administrador e vai ter a especialização em qual área desejar. Era administração de empresas unicamente.

 

Pergunta: Os alunos normalmente eram empregados de empresas da região?

 

Resposta:

A grande maioria.

 

Pergunta: Então o fato de inaugurarem uma escola de administração era por causa da vocação da região?

 

Resposta:

Esse era um apelo importante. O curioso é que era uma escola de administração, economia e ciências sociais. Isso tinha influência do perfil da região. E também tinha uma outra condição, que são cursos relativamente fáceis de instalar. Diferente de um curso de medicina, que na época e até hoje continua sendo um curso difícil. Hoje é diferente porque você tem a questão da informática envolvida, laboratórios e na época isso não tinha a força que tem hoje. Mas era tão dependente da região que, para você ter uma idéia, foi criado um curso vespertino que era uma coisa sem pé nem cabeça, porque começava às cinco horas e quinze minutos e terminava dez minutos antes do período de a noite começar. Começava cinco e quinze por quê? Porque o expediente da General Motors terminava às cinco horas. Então, nesse interregno foi entendido, na época, que poderia ter o curso vespertino. E o Conselho Estadual de Educação não se conformava, achando que eram dois cursos noturnos. Não era um curso do sol poente, mas vespertino. Ele era classificado pelo Conselho como se fosse um outro horário. Durou algum tempo até que de repente começou a criar uma série de problemas, com os horários não batendo.

 

Pergunta: O senhor tem idéia de quanto tempo durou esse curso vespertino?

 

Resposta:

Ficou bastante tempo. Ele ficou uns quinze anos.

 

Pergunta: Eu cheguei a trabalhar no vespertino em 1987. (Inaudível)

 

Resposta:

Na época eu já estava formado e ele foi implantado, estou imaginando que uns 8 anos depois. Não levem a sério as minhas colocações no tempo.

 

Pergunta: Quando foi formado o curso de administração, já tinha o vespertino?

 

Resposta:

Eu acho que veio depois, mas não lembro. Houve uma primeira tentativa de um curso matutino. Eu só não lembro se ele precedeu o vespertino ou foi simultâneo. Houve um curso matutino e é possível que ele não deu certo. As pessoas trabalhavam e o alunado não era significativo.

 

Pergunta: Como funcionava o Diretório Acadêmico?

 

Resposta:

Na época o presidente do diretório era o professor Gil, do curso de ciências sociais. Eu conheci o Gil nessa época, lá no prédio, depois da Espírito Santo, porque lá funcionava só o curso de administração. Foi quando nós fomos para o prédio da Fundação das Artes, que já estava o pessoal de ciências sociais e economia e o professor Gil era o presidente e eu estava liderando aquele grupo que vinha e nós nos entendemos e compusemos e até hoje temos uma amizade fraterna. E aí a gente seguiu a atividade acadêmica.

 

Pergunta: Teve algum movimento mais forte que vocês fizeram? (Inaudível)

 

Resposta:

Lembro de uma época em que o professor Oscar era o diretor onde havia infiltrado nas classes pessoas ligadas às forças de segurança. Tive um colega que sumiu por dez dias e quando ele voltou estava abatido, por ter ficado no cárcere. Era uma época dura, mas eu ainda estava na escola. Era um período duro, mas no IMES nunca aconteceu um fato que tenha tido repercussão. Aconteceram coisas, mas a direção soube conduzir o processo e os alunos também eram alunos que trabalhavam. Era um outro perfil. Não eram alunos que se dedicavam à escola e tinham tempo. Não tinham. Todo mundo tinha família para cuidar, tinha de trabalhar e não tinha espaço para você ficar com grandes momentos livres para concentrar ou se reunir. Diria que a atividade estudantil no IMES passa a ganhar muito mais força nos anos 70, de lá para frente, quando acabei assumindo a direção da escola, e estava bem marcante a presença, com um diretório acadêmico bem politizado e com grandes discussões, grandes assembléias, e coisas mais significativas. Com o IMES ainda um pouco novo e com um perfil de alunos mais velhos, preocupados em concluir a escola para tocar sua vida, não era tão forte.

 

Pergunta: Como foi a sua passagem de aluno para depois vir a ser professor e assumir a direção?

 

Resposta:

Foi curioso. Eu comecei a dar aula mas não foi aqui. Comecei a dar aula na Metodista porque o diretor da Metodista, quando estavam instalando o curso de comunicação na Metodista, ele pediu ao IMES que indicasse alguém para dar aulas de marketing. Eu estava me formando aqui e já era monitor, só que era monitor em TGA, Teoria Geral da Administração. Esse ponto é interessante. O professor de TGA, Júlio Gomes Bergamo, uma pessoa maravilhosa que já tinha idade, pediu para a escola indicar um monitor para ele, porque ele já tinha uma certa idade. A escola me selecionou e fui ser monitor do professor. Aí o diretor, o professor Oscar, foi me apresentar a ele na sala dos professores, que ficava no fim do corredor: Professor, esse é o Sílvio, que vai ser monitor. Ele falou: Muito prazer, que bom que você está aqui e que bom que você veio hoje. Eu estou com um problema sério e você pode dar essas duas últimas aulas? Assim eu dei minhas duas primeiras aulas. Eu não tinha a menor idéia, porque estava me formando. Então, naquela época a gente dava TGA dividido em funções, etc., e o que eu podia fazer? A única coisa com a qual eu tinha um pouco de afinidade era com a área comercial e de vendas. Eu imediatamente introduzi a função comercial que era um dos temas. Tinha a função condução, condução comercial. Hoje nós vamos ter função comercial. Mas o professor não estava vendo isso. Não importa o que vocês estavam vendo. Era a única coisa que eu podia falar. Aí eu comecei a falar de função comercial e continuei dando a maior parte das aulas, mas depois eu tive mais tempo para me preparar. Acabou esse ano e a Metodista pediu alguém para dar pesquisa de opinião e mercadologia. Eu fui indicado para lá e comecei a dar aula e fiquei uns três anos. Na metade do ano seguinte eu já me consolidei como professor aqui na escola. Em 1973, já no segundo semestre, acabei vindo para cá e em 1974 assumi aulas aqui, já na área de vendas. Na época não era mercadologia, mas administração de vendas. E assim comecei a dar aulas em 1973. O primeiro foi na Metodista. Aconteceu uma coisa interessante. Rapidamente eu comecei a dar aula na ESAN e passei a não ter mais noites. Isso ocupou a minha vida completamente. Mas uma coisa me marcou muito. Quando comecei a dar aula aqui, eu entrava na sala dos professores e ficava até constrangido, porque eram pessoas que eu respeitava muitíssimo. Naquela época, certamente mais do que hoje, havia uma relação entre aluno e professor que era importante. Quando eu me vi na sala dos professores, eu nem tinha coragem de me envolver. Ficava no canto. Um dia o professor Conto, aquele que veio da ESAN, viu que eu estava lá. Ele tinha sido meu professor no segundo ano, um professor que tenho como referência até hoje. Tenho o professor Conto na minha mente, a maneira como ele dava aula. Ele trazia uma garrafa térmica com sopa e ele tomava. Aliás, por causa disso que quando eu fui diretor eu fiz a cantina, porque achava um absurdo um professor trazer da casa dele a sopa. Quando assumi a direção, a primeira coisa que fiz foi uma cantina no cantinho, para oferecer alguma coisa para os professores. Mas enquanto eu tomava um café e ele tomava a sua sopa, ele me disse: Quer dizer que você está começando agora? Falei: É, professor, estou sim. Ele perguntou se eu tinha família, falei que sim. Ele falou: Você pretende ser professor? Falei: Não, só quero dar umas poucas aulas, só para ter esse convívio, me manter atualizado. Um discurso meio clássico. Ele falou: Essa história eu já ouvi muitas vezes. Presta atenção no que vou te falar. Você não vai ver seu filho crescer. Você escolheu uma carreira que tem isso, isso e isso de bom. Ele falou uma coisa interessante: Cada dia você vai mudar o mundo. De fato é o que acontece na sala de aula. Quando a gente dá uma aula, quando acabou a aula, o mundo não é mais o mesmo, porque aqueles alunos já são diferentes de quando começou a aula e o professor não é o mesmo também. Quem me despertou para isso foi ele nessa conversa. Ele falou que isso é fantástico, você vai se encantar, mas você não vai ter tempo para a família. E começou a falar tudo. E eu falando que não, que não tinha aquilo comigo. No fim daquele ano eu já estava dando aula de segunda a sexta à noite e assim foi toda a minha vida. Meus filhos de fato cresceram, e quem cuidou foi a minha mulher, porque meu convívio era pouco, porque além dar aula, eu também trabalhava, como dizem os alunos, então tinha minha atividade profissional fora da escola durante o dia e à noite eu vinha aqui, na ESAN e na Metodista. Depois aqui começou a solicitar muito e deixei a Metodista e a ESAN e passei a me concentrar mais aqui e aí foi. São situações que acontecem e marcam a gente. O professor Conto tinha muita experiência e ele falou essas coisas que foram marcantes. Assim me envolvi na vida acadêmica. Um belo dia fui chamado para ser chefe de departamento. Naquela época a escola tinha a estrutura por departamentos. Eu fui chefe do departamento de administração por dois períodos e depois fui convidado, lembrado para participar da eleição para diretor da escola.

 

Pergunta: Entre a sua entrada como professor e a direção... (Inaudível)

 

Resposta:

Eu trabalhava em empresas. Trabalhei na Oxigênio do Brasil, depois saí e fiz minha primeira tentativa como consultor autônomo e depois percebi que não era a hora ainda, aí fui para a Rhodia e participei da implantação da gerência de marketing industrial têxtil da Rhodia, depois eu voltei para a Oxigênio do Brasil, mas já cominando uma condição de consultoria e depois segui como consultor.

 

Pergunta: E quando foi diretor do IMES, você trabalhava nessa empresa?

 

Resposta:

Eu tinha uma empresa junto com meu irmão, na época. Era uma empresa de consultoria e processamento de dados. Naquela época existia uma figura, que hoje não existe mais, que era o bureau de processamentos de dados. Nós tínhamos uma empresa interessante que foi bem formada, mas depois tivemos problemas com ela, superamos os problemas, mas depois acabei me afastando e segui com a atividade de consultoria somente. Aí assumi a direção. Na direção fiquei 8 anos. Eram quatro anos, mas a congregação, o conjunto de todos os professores, houve um entendimento que seria adequado que a gente complementasse, então houve essa abertura para mais um mandato.

 

Pergunta: A sua gestão como diretor foi antes da do Moacir Rodrigues?

 

Resposta:

Foi antes.

 

Pergunta: E como o IMES cresceu, avançou?

 

Resposta:

O foco principal, eu tive um entendimento na época. Quando eu assumi a direção, a escola estava muito adequada, muito bem posta do ponto de vista acadêmico, didático, porque o professor Cláudio, que foi o diretor que me antecedeu, foi um professor muito competente e ele cuidou de organizar a escola. Quando eu assumi a escola não tinha os problemas que o professor Oscar enfrentou quando foi diretor. A escola estava redonda sob esse aspecto. Ela precisava criar bases para poder crescer. Inclusive quando se cogitou a minha indicação e eleição, a idéia era criar condições para que isso ocorresse. Eu fui diretor e o professor Jorge Alves da Silva foi vice-diretor. Nós seguimos. O que eu tinha como meta? Criar as condições básicas para a universidade. Eu tinha um entendimento do qual eu me arrependi. Eu entendia que a universidade, antes de ser uma universidade de direito, tinha de ser uma universidade de fato. Ela tinha de ter espírito universitário, cultura universitária, para depois se propor a ser uma universidade. Na época eu criei o  Centro de Pós-Graduação, o Instituto de Pesquisa e a revista. O Instituto de Pesquisa tinha a função de trazer para dentro da escola o convívio com a mentalidade de pesquisa, ter um núcleo que soubesse fazer pesquisa. Você não tem como imaginar uma universidade que não sabe fazer pesquisa. A Pós-Graduação era para dar aos alunos que se formavam na escola a condição de continuar na escola, se aprofundando, porque a gente perdia o aluno num momento importante. Naquela fase em que o aluno é cheio de dúvidas, a gente ficava com o aluno e depois, quando o aluno ficava bom, no último ano, quando ele sabia o que queria da vida, ele ia fazer a pós dele em outro lugar. A gente criou a pós-graduação para dar essa continuidade, essa possibilidade de continuidade aos nossos alunos. E a revista era para que a produção científica e de pesquisa que fosse gerada tivesse um lugar onde ela pudesse ser publicada. Esse era um trinômio. E a pós-graduação, embora lato sensu, era a primeira célula da atividade de pós-graduação dentro da escola.

 

Pergunta: Continuando sobre o período da sua gestão com diretor.

 

Resposta:

A gente queria plantar uma célula da universidade, que era uma visão nossa, minha particularmente, que primeiro nós precisávamos trazer para dentro do IMES o ambiente da universidade, o clima da universidade, porque o IMES era uma escola como as outras, aonde o professor chegava e dava sua aula, o chamado professor de carreira, vinha, dava aula, saía na carreira para dar aula em outra escola. Aquele engajamento com o aluno, a pesquisa, a extensão, que é uma coisa fundamental para a universidade, não tinha. Então, a gente criou o Instituto de Pesquisa e a Pós-Graduação e a revista com as intenções que acabei de mencionar. O Instituto de Pesquisa para dar condições de desenvolver projetos de coletas de dados, lidar com isso, aprender a lidar como se coleta e como se pesquisa. A Pós-Graduação já foi comentada e a revista para ser o esteio, o loco de comunicação das pesquisas que fossem feitas. E assim foi. Através do Instituto de Pesquisa a gente conseguiu começar a fazer trabalhos de extensão muito interessantes. Aconteceram coisas de importância. Eu me lembro que em 1984 ou 1986 nós ganhamos um prêmio Top de Marketing ABBV porque nós começamos a fazer as pesquisas sócio-econômicas duas vezes por ano. Isso foi uma coisa que começou em 1982, logo no começo da minha primeira gestão e a intenção era realmente transformar o IMES num referencial regional de informações sócio-econômicas. E a idéia seria, através disso, ocupar espaço na mídia, dando destaque à imagem do IMES. Sempre entendi que não seria através de anúncios que o IMES iria se consolidar, mas seria através da sua citação com fonte da geração de dados de pesquisas e trabalhos. E assim foi que isso ocorreu. A gente começou a fazer esses trabalhos.

 

Pergunta: É desse período então essa reportagem da Revista Veja?

 

Resposta:

Essa matéria que saiu na Revista Veja, na capa, onde se descobriu um novo ABC, porque a idéia que se fazia do ABC na época era um lugar cheio de operários, andando de macacão manchados, uma cara triste, isso foi desmontado com a matéria que a Veja fez, em cima das pesquisas que nós fizemos. Acho que foi na quinta bateria de pesquisa que nós fizemos, se não me engano, onde nós mostrávamos um perfil do ABC em nível de renda, tudo completamente diferente. E foi em função dessa matéria que nós passamos a receber Eldorado, Mappin, Carrefour, tantas empresas grandes que queriam saber um pouco mais de como é o ABC, e assim elas se instalaram aqui. E a gente começou a prestar serviços de extensão, a fazer projetos. Uma coisa que foi importante, nós fizemos todo o trabalho, um projeto que junto com a professora Maria do Carmo a gente coordenou, um projeto que quantificou e qualificou o mercado de telefonia móvel no Brasil. Quando a Telebrás quis implantar no mercado, na época se falava em telefonia móvel celular, que ficaria no carro. Nós participamos de uma licitação e ganhamos a concorrência e fizemos esse trabalho, que foi muito interessante, que viu o mercado no Brasil todo. Foram 11 capitais.

 

Pergunta: O senhor acha que todo esse trabalho do IMES contribuiu para formar e para interferir nas representações da atividade industrial, de tirar aquela imagem de cidade operária tristonha?

 

Resposta:

Tem tudo a ver. E basta que você volte no tempo e pegue essa matéria da Veja e veja o que aconteceu depois. A matéria da Veja está pautada na pesquisa do IMES. E veja quem veio depois. O INPES deve ter o registro dos serviços que prestou, das informações que deu a essas empresas importantes, tanto do comércio, como indústrias que vieram. Essa coisa acabou sendo importante porque foi em função do INPES que tinha acontecido aquilo. Mas também já se falava em mercados de doutorado e eu fui indicado ao IBGE. Esse trabalho regional do Instituto de Pesquisa foi conhecido por uma pessoa que um dia virou Ministro do Planejamento, e aí ele me convidou para a Presidência do IBGE, na tentativa de produzir no IBGE condições de auto-sustentar o IBGE, como a gente fazia aqui. Foi uma atividade importante. Por que digo que foi uma atitude equivocada minha imaginar que primeiro precisávamos consolidar a universidade de fato para depois ser de direito? Porque enquanto a gente se sentia, em condições firmes, aí o professor Moacir vem e lança a pedra da universidade, tudo foi uma coisa concatenada. Essa foi uma característica do IMES. As direções seguiam sempre com muita amarração e conseqüência, uma em relação à outra. O professor Moacir lança a pedra da universidade, mas depois a gente descobre que a questão da universidade não era técnica, mas política. O que menos importava para quem devia nos transformar em universidade era se nós tínhamos competência, se nós tínhamos trabalhos de extensão, pesquisa. Isso não importava. Era uma decisão política e isso nos entravou muito tempo. Um dia eu tive o desprazer de, na companhia do professor Marco Antonio e do professor Moacir, ouvir do Conselho Estadual de Educação que de fato era uma decisão política. Se talvez já naquela época nós tivéssemos caminhado para uma ação política, independente de transformar a escola firmemente nas questões que suportam uma universidade, talvez ela já fosse uma universidade naquela época. Tenho de reconhecer que avaliei mal a questão. Achei que primeiro ela tinha de se sustentar. Mas isso acabou acontecendo e depois terminou o meu mandato, aí fui lembrado pelo IBGE e do IBGE fui lembrado para a Fepasa, tive um certo envolvimento com a administração pública.

 

Pergunta: Os oito anos foram consecutivos?

 

Resposta:

Sim.

 

Pergunta: Depois você não voltou para a direção?

 

Resposta:

Não. Depois, com a consolidação da universidade, eu ocupei durante um espaço de tempo a Pró-Reitoria de Pesquisa. Foi quando a gente implantou o programa de mestrado em administração. Também numa avaliação de que seria mais rápida do que foi a consolidação dele, mas a gente descobriu que havia também questões que precisavam ser superadas e acabaram sendo superadas depois. Aí eu deixei a Pró-Reitoria de Pesquisa e tive uma atividade externa, mas sempre ligada à escola. Trabalhei também na direção geral da agência reguladora de transportes do Estado de São Paulo.

 

Pergunta: E no começo, havia poucas professoras? Como era essa relação?

 

Resposta:

A professora Neide era a única professora. Ela é uma figura muito singular. Ela era esposa do professor Celso, mas ela sempre soube se posicionar, sempre soube se pôr e nunca teve problemas.

 

Pergunta: Como era a questão da mulher? Uma mulher só?

 

Resposta:

Ela sempre foi respeitada. Evidente que, não consigo imaginar se em algum momento ela se sentiu minimizada ou abafada. Eu nunca notei, nem eu nem a maioria dos professores. Nunca foi motivo de assuntos, de comentários. A professora Neide sempre teve aquela altivez dela, aquela maneira dela muito amável com todo mundo, mas muito firme. Era aquela guerrilheira romântica. Ela era firme e ao mesmo tempo era suave.

 

Pergunta: E do ponto de vista dos alunos?

 

Resposta:

Posso te dar o testemunho perante os professores. Perante os alunos, te confesso que não tive nada, até porque quando assumi a direção não era mais ela sozinha, tinha outras mulheres. Quando fui diretor que passei a ter mais informações. Quando a gente é professor a gente não tem todas as informações sobre tudo que acontece com todos os professores. Eu nunca soube de algum fato. Acho que ela sempre se conduziu bem.

 

Pergunta: No início do IMES como era a quantidade de mulheres entre os alunos?

 

Resposta:

Pouquíssimas. Na minha classe me lembro de três mulheres.

 

Pergunta: O senhor se lembra dos outros nomes que foram com o senhor para escolha para a direção?

 

Resposta:

Não posso dizer isso.

 

Pergunta: Para terminar a gente pede ao depoente que deixe uma mensagem, faça um balanço sobre a sua vida, algo que queira deixar registrado.

 

Resposta:

Acho que o IMES tem, ele conseguiu, ao longo da sua existência, se transformar naquilo que a gente chamava de objetivo de vida comum de todos aqueles que militavam pelo IMES. Eu me refiro a uma época em que o IMES era menor, que foi quando isso foi muito levantado e depois a coisa evoluiu. Então, o IMES foi muito importante para muita gente, porque sempre se fez um trabalho com muita seriedade. O fato de o IMES não ter compromisso com a geração de lucro, apenas compromisso com a sua sobrevivência financeira, mas ele não tem de dar resposta de lucro para nenhum acionista, isso é uma coisa importante, porque você consegue ter dentro da escola o que a escola gera. Então, fica muito mais fácil de você conduzir dessa forma, desde que você tenha sempre presente a idéia de que o IMES não é importante para quem está, mas é importante para quem esteve, para quem está e para quem virá. Este era o argumento que eu usava quando os alunos me questionavam por que estava construindo aquele prédio onde hoje funciona a reitoria. Onde está o Centro de Pós-Graduação, eu estava construindo aquele prédio e os alunos me questionavam que com aquele dinheiro da construção daria para diminuir a mensalidade. Eu sustentava que assim como hoje ele está aqui, no passado você não estava e alguém no passado pagou para você estar aqui hoje, esse argumento era retirado, porque grande parte daqueles alunos que me questionaram dessa maneira depois foram para lá fazer pós. E essa é história do IMES. Então, esse compromisso com quem passou, não vamos esquecer quem passou. Embora sempre se tenha uma tendência de se deletar o passado, mas o passado é fundamental e a gente aprende muito em cima dele. Não aprende apenas como pessoa física, mas como pessoa jurídica. O presente, o compromisso de fazer alguma coisa agora e para aqueles que virão. Hoje eu dou aula para alguém que é filho de alguém que foi meu aluno aqui. É uma coisa meio maluca se você parar para pensar. Não é só pelo fato de estar ficando velho, mas porque de fato o IMES faz parte da vida, de forma importante, de muita gente. Aqui eu vi sonhos se realizarem, sonhos se esvaírem, vi casais se formarem, se separarem. Coisas significativas nas vidas das pessoas. O IMES tem história que influenciou concretamente muita gente, professores, dirigentes, alunos, funcionários. Temos funcionários maravilhosos aqui. E isso tudo fazia uma grande sinergia. Em 1982, 1983, em torno disso, a situação financeira do país não estava boa, e os alunos com dificuldade em pagar a escola e se eu aumentasse a anuidade ia ter inadimplência. Reuni a congregação de professores e falei: Se houver aumento para os professores, eu vou ter de repassar para os alunos e vamos ter problemas assim e assim. Queria a concordância de vocês para que a gente não desse o dissídio neste ano. Evidente que houve um frisson natural das pessoas, mas todos entenderam e apoiaram. Teve pessoas que apresentaram seus argumentos, mas quando acabou a reunião não se tocou mais no assunto. Tudo seguiu igual. Você chega e fala para o professor que não vai ter aumento por causa disso e disso, explica as razões. E todo mundo entendeu. E não é que ficou aquela coisa, mas acabou a reunião, acabou. As reuniões eram aos sábados e na segunda-feira todo mundo trabalhando, vida nova e não se tocou no assunto. Isso é o IMES: muita boa ação, muita entrega e por isso que tenho uma enorme satisfação de estar no IMES. Eu só parei de dar aula quando estava no IBGE, porque tinha de estar no Rio e em Brasília e não tinha jeito de dar aula. Tudo mais que fiz na vida, nunca deixei de dar aula. Sempre mantive a minha atividade aqui. Na época, quando assumi o IBGE, eu era professor do IMES e da USP. Se você pegar meu currículo lá no IBGE, eu coloquei que era professor do IMES. Por quê? Porque essa era a relação de afetividade. A mensagem final é no sentido de que todos nós, que a gente prestasse atenção para que essa circunstância, esse clima, esse ambiente, essa maneira de se relacionar nunca deixasse de ser como sempre foi, que ela seguisse assim. Espero, daqui um tempão, quando a gente estiver ouvindo essa fita, daqui a 10 anos, 20 anos, a gente diga que de fato a gente continua como era antigamente.

 


Acervo Hipermídia de Memórias do ABC - Universidade de São Caetano do Sul